Estamos em plena era da tecnologia. Usamos equipamentos tecnológicos para quase tudo e piramos quando o aparelho trava ou por algum motivo para de funcionar. Perder o celular passou a ser uma desgraça, pois temos praticamente tudo ali: fotos, e-mail, jogos, calculadora, ferramentas de pesquisa, redes de relacionamento e muito mais. Com a chegada da pandemia, o uso da tecnologia passou a ser enfatizado. Usem as tecnologias a seu favor! Se mantenham conectados com os demais por vídeochamadas. Essas são algumas das recomendações do momento.
E lá vamos nós para a teleaula, tele-reunião, telediversão, teleconferência. São tantas atividades em conexão que está se falando em tele-estresse, ou seja, o estresse gerado pelo uso intenso das tecnologias. O uso excessivo do celular é um ralo cerebral, que drena a energia afetiva e cognitiva, nos lembram os neurocientistas. Se já estávamos muito conectados ao celular, o que dizer agora? E os jovens com os jogos on-line? As crianças com os vídeos infantis? A tendência é que esses usos tenham se ampliado. Compreensível nessa fase. Mas quem já vinha abusando? A dependência tecnológica configura um transtorno mental que confirma a máxima de que a diferença entre o remédio e o veneno é a dose.
O uso saudável da tecnologia implica em manter atividades variadas, e, dentre elas, o momento de diversão através do computador, videogame ou celular. Devemos tomar cuidado desde cedo. Crianças devem brincar com brinquedos, explorar sucatas, correr, pular. Até os três anos, não é necessário incluir os vídeos e jogos de celular dentre as brincadeiras infantis. Muitas vezes os pais buscam esse recurso como uma “chupeta eletrônica” (termo cunhado pelos estudiosos do abuso tecnológico), muito útil, ao que parece, em restaurantes. Mas assim privamos os pequenos de aprender a esperar e limitamos nossa criatividade no entretenimento dos filhos. O uso nessa fase, se necessário, não deve ultrapassar uma hora e precisa ser acompanhado por um adulto. Após os quatro anos, pode ser concedida uma hora, ainda com supervisão. O limite de tempo pensado por profissionais da saúde, respeita as necessidades das crianças de conviver com estímulos variados. Quanto mais tempo parado na tela, menos exercício corporal, menos desenvolvimento da criatividade e aprendizagem do ter prazer com atividades menos recompensadoras. Por exemplo, montar Lego ou jogar dominó, são atividades que não conseguem concorrer com a intensa ativação da área de prazer, no cérebro, que os eletrônicos facilmente ativam por serem ricos em cor, movimento, desafios. Esse é um dos motivos que favorece o uso excessivo, em especial por adolescentes, cuja sugestão é de que se expusessem às telas por até quatro horas. E de preferência não noite adentro, pois não somos corujas, fomos feitos para dormir durante a noite. Estamos longe do recomendado...
Contudo calma, não se assustem, as regras são norteadoras, mas precisam se adaptar à vida de cada família. Todo lar tem as suas regras próprias, que devem se basear em alguns parâmetros. Para os adolescentes, o limite extrapola quando abandonam o convívio com a família, deixam de participar das refeições, ficam irritados quando não podem estar conectados, relaxam com o banho e a alimentação. Esses indicadores apontam para o abuso dos eletrônicos e possível dependência, cuja falta gera síndrome de abstinência, que pode levar à mentira quanto ao tempo de jogo e a falta de aceitação das tentativas de limites. Situações desse tipo exigem tratamento psicológico com inclusão dos pais. Não raro os pais também estão usando excessivamente as tecnologias, conversando pouco com os adolescentes, brincando pouco com as crianças.
Que fase difícil! Nos testa e nos cobra equilíbrio para tudo. A vida é assim, esse palco de aprendizagens. E muitas aprendizagens sobre o próprio coronavírus foram possíveis através dos avanços proporcionados pela tecnologia. Sim, somos gratos ao avanço tecnológico. O desafio é usar esses recursos de modo saudável, sem excesso. Até mesmo estudar em demasia passa a ser pernicioso. Por isso buscamos constantemente o equilíbrio. E entendamos que agora o uso tecnológico será maior. Estamos muito limitados em outras formas de lazer, trabalho, estudo. Mas não deixemos de puxar pela criatividade para rechear a vida com outras atividades, com maior variedade de situações. E que possamos tolerar passatempos mais e menos recompensadores, o que combina mais com o ritmo da vida. Sigamos o ritmo da vida, pois somos humanos, precisamos conseguir relaxar, lidar com o ócio, aprender a nos animar com diferentes alternativas e a parar quando estivermos extrapolando. Não somos máquinas ou robôs. Aprendamos a nos conectar e a desconectar.
Texto publicado no jornal Gazeta do Sul, junho/20. Ilustração: Matheus Steffens Bartz Instagram: instagram.com/mbartzart
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